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   O Que Quer Dizer “Primeiro Amor”?




O que é o“primeiro amor”

         Em minha opinião, a expressão “primeiro amor” não se refere tanto à característica temporal, e, sim, muito mais à característica qualitativa, à importância. O essencial é que o amor a Jesus ocupe o primeiro lugar em minha vida, isto é, que ocupe a posição de principal e melhor amor; importa que as prioridades estejam na ordem correta.
         Quando um marido passa a colocar os esportes, a televisão ou seu hobby à frente de sua esposa com o passar dos anos (mesmo que lhe seja fiel, que ainda goste muito dela, que não consiga mais imaginar sua vida sem ela e que ela continue cuidando dele o tempo todo), então ele abandonou o seu primeiro amor em relação a ela.
         Quando a paixão e a devoção a Jesus diminuem, o primeiro amor por Ele já foi abandonado. Esse principal e melhor amor não pode ser substituído por perfeccionismo, nem por esforços e perseverança, nem evitando maus pensamentos e ações. Revelar o mal, trabalhar e sofrer para o Senhor também não resolve. Isso tudo é bom e necessário, afinal, o próprio Senhor reconhece que são atitudes elogiáveis (Ap 2.2-3); mas elas também podem partir de um hábito puramente mecânico, e ficar engessadas em formalismo e tradicionalismo.
         Por ocasião de seu jubileu de ouro no serviço militar, Paul von Hindenburg (1847-1934) [que mais tarde foi presidente da Alemanha], recebeu altas honrarias. Sua resposta foi modesta: “À guerra, o espírito – ao rei, o coração – à pátria, o sangue – a Deus, a honra!” Mas Deus quer nosso amor inteiro e completo, sem dividi-lo com ninguém (Mt 22.37). Nosso espírito, nosso coração e nosso sangue pertencem somente a Ele. O Senhor não quer somente a honra, mas toda a devoção dos que que se voltam para Ele em amor.
         Em muitas igrejas tudo corre conforme os padrões bíblicos, e não há nada que se possa dizer contra elas. Ainda assim, falta o primeiro amor ao Senhor, pois a vida estruturada da igreja assumiu o lugar de Jesus Cristo. O Senhor Jesus sempre deve estar em primeiro lugar. Esse primeiro amor a Ele é que deve impulsionar o que fazemos por Ele, e não o contrário. Penso que era isso que Jesus estava querendo dizer aos cristãos da igreja em Éfeso: para eles, agir em nome do Senhor vinha antes, e o amor profundo a Jesus estava só em segundo lugar; a rotina descompromissada tinha passado acima da vida espiritual.

Um exemplo de primeiro amor por Jesus

         Lemos em Lucas 10.38-42:
 
“Indo eles de caminho, entrou Jesus num povoado. E certa mulher, chamada Marta, hospedou-o na sua casa. Tinha ela uma irmã, chamada Maria, e esta quedava-se assentada aos pés do Senhor a ouvir-lhe os ensinamentos. Marta agitava-se de um lado para outro, ocupada em muitos serviços. Então, se aproximou de Jesus e disse: Senhor, não te importas de que minha irmã tenha deixado que eu fique a servir sozinha? Ordena-lhe, pois, que venha ajudar-me. Respondeu-lhe o Senhor: Marta! Marta! Andas inquieta e te preocupas com muitas coisas. Entretanto, pouco é necessário ou mesmo uma só coisa; Maria, pois, escolheu a boa parte, e esta não lhe será tirada”.  Lucas 10.38-42
         Marta empenhou tudo para que Jesus fosse recebido dignamente com a melhor comida e bebida, e com certeza não fez isso sem amor. Mesmo assim, o Senhor precisou adverti-la; mas sua irmã Maria foi elogiada por Ele. Devemos fazer uma coisa sem deixar a outra de lado – mas as prioridades devem estar na ordem certa. Esse acontecimento mostra que Maria escolheu a atitude melhor, o que nos dá um exemplo do “primeiro amor” a Jesus. Importa primeiro sentar aos Seus pés, ouvir a Sua palavra e reconhecer a Sua vontade. Esse primeiro amor ao Filho de Deus não existe sem que a Sua vontade seja feita. Mais tarde, a mesma Maria derramou o ungüento precioso sobre os pés de Jesus. João 12.3 nos relata essa ação:
 
“Então, Maria, tomando uma libra de bálsamo de nardo puro, mui precioso, ungiu os pés de Jesus e os enxugou com os seus cabelos; e encheu-se toda a casa com o perfume do bálsamo”.  João 12.3
          Maria “escolheu a boa parte”, a melhor, a superior, “e esta não lhe será tirada”.
         Que contraste com as palavras de Jesus: “Tenho, porém, contra ti que abandonaste o teu primeiro amor”. O primeiro amor havia sumido e por isso a igreja de Éfeso corria perigo de perder sua luminosidade. No exemplo acima, quem brilha mais? Marta ou Maria?

“Primeiro Jesus!”

         A visita de Jesus à casa de Maria e Marta e o ato de amor de Maria mostram claramente a importância que o Senhor dá à dedicação completa de todo o nosso amor a Ele, ao nosso viver com Ele e a partir dEle e ao serviço devotado que brota dessa ligação vital. O princípio é este: primeiro amor profundo a Jesus e só então serviço em Seu favor. É muito importante ouvi-lO e adorá-lO por meio do estudo da Bíblia, da oração, do silêncio em Sua presença. Infelizmente é possível esgotar-se pelo Senhor mesmo que tenhamos nos tornado indiferentes em relação à comunhão com Ele. Devemos fazer o primeiro sem desprezar o segundo – ou teremos abandonado o primeiro amor.
         O principal amor deve ser devotado ao Senhor Jesus, que amou primeiro os Seus – por meio de Seu sofrimento e da Sua morte vicária na cruz, assim como através de Sua ressurreição e ascenção aos céus. Em outras palavras: Ele precisa ser o primeiro em nossas vidas. O Senhor Jesus expressou dessa forma radical a seriedade absoluta com que encara esse primeiro amor a Ele:
 
“Quem ama seu pai ou sua mãe mais do que a mim não é digno de mim; quem ama seu filho ou sua filha mais do que a mim não é digno de mim” (Mt 10.37).
         A palavra grega para “primeiro” é “protos”, que refere-se menos à importância cronológica e mais à importância qualitativa. Assim, o “primeiro” amor é o “melhor” amor. Podemos derivar disso também expressões como “lugar de honra”“líder”“ser o primeiro” ou “assumir o lugar principal”. No tabernáculo, o lugar santo antes do Santo dos Santos também era chamado de “primeira tenda” ou “tenda anterior”. Ali os sacerdotes atuavam na presença direta do Senhor; não havia mais nada entre eles. Também isso revela a vontade do Senhor: que vivamos tão diretamente com Ele e na Sua presença, que Ele tenha o primeiro lugar em nossas vidas!
         A mesma palavra grega “protos” também é usada na parábola do filho pródigo, que voltou para o pai totalmente empobrecido e com as roupas rasgadas. Este mandou lhe trazer a primeira, isto é, a melhor roupa:“Trazei depressa a melhor roupa, vesti-o…” (Lc 15.22). Não se tratava de uma roupa de festa que o filho talvez já tivesse usado em ocasiões passadas, mas, sim, da principal roupa de festa.
         O Senhor encontrou muitas coisas boas entre os cristãos da igreja em Éfeso (cf. Ap 2.2-3), mas Ele em si não era mais o Melhor e Primeiro entre eles. Alguém disse, com muita propriedade: “O bom é inimigo do excelente”. Mais uma vez: o melhor – o primeiro amor a Jesus – deve vir antes de qualquer outra coisa. Quando permitimos que algo venha antes do “primeiro amor”, então este passa a ser o segundo ou até mesmo o terceiro amor.
         O seu amor pertence primeiro ao Senhor Jesus? Ele tem prioridade absoluta em sua vida? Você realmente coloca todo o resto depois dEle em sua vida? Você se esforça para prestar atenção ao que Ele diz quando procura lhe falar por meio de Sua Palavra na Bíblia, a fim de ter comunhão verdadeira com Ele? Você continua a amar o Senhor Jesus sobre todas as coisas quando perde tudo aquilo que lhe é caro, quando, por algum motivo, não pode mais trabalhar ou se movimentar? Você aprendeu a amá-lO sobre todas as coisas? Você escutou e aplicou a tempo em sua vida a advertência de Jesus para os cristãos de Éfeso? O Senhor descreveu o significado do verdadeiro discipulado com estas palavras extremamente sérias:
 
“Assim, pois, todo aquele que dentre vós não renuncia a tudo quanto tem não pode ser meu discípulo” (Lc 14.33).
         Certa vez Charles Haddon Spurgeon contou esta emocionante história, que combina muito bem com o tema do “primeiro amor”:
 
“Nós amamos nossas famílias, mas em comparação a Ele podemos odiar pai, mãe, irmãos e irmãs por amor do Seu nome. Quando certo mártir estava para ser queimado, trouxeram-lhe sua esposa e seus onze filhos para tentar convencê-lo a renegar sua fé. Ordenaram aos seus familiares que um a um se ajoelhassem à frente dele, pedindo-lhe que negasse sua fé e vivesse por amor à família. Mas, beijando um após o outro e demorando-se junto à mulher amada, ele disse: ‘Por amor de vocês, meus queridos, gostaria de fazer algo que me permitisse continuar vivendo com minha família; mas como se trata de Cristo, meu Senhor, preciso me afastar de vocês”’.

Autor: Norbert Lieth
Fonte: Estudos Gospel